O vendedor da loja
que vendeu fogos de artifício à banda Gurizada Fandangueira, usados no
dia do incêndio que deixou 235 mortos na boate Kiss, em Santa Maria
(RS), afirmou que o produtor da banda optou por um tipo de fogos
proibido para locais fechados, por serem mais baratos.
Segundo reportagem
do Jornal Nacional, o funcionário afirma ter alertado ao produtor que
não deveria usar os fogos. "Ele sempre levava só o sputnik. Nesse dia,
ele decidiu levar chuva de prata para testar”, contou o vendedor.
O vendedor diz que
estava na loja no dia em que o produtor foi comprar o material para ser
usado na Kiss, no dia 25 de janeiro. "Várias vezes a gente dizia para
ele, ‘bah, tu tá usando na parte interna’. Ele dizia: ‘mas eu sei como
eu tô usando, tô usando com segurança, eu tenho o curso’. Disso de ele
ter o curso é pior ainda. Se tem o curso, ele sabia que não podia usar,
né?”
Questionado sobre
se ofereceu fogos apropriados, o vendedor diz: "Sim. Esse custa R$ 75.
Ofereceu um preço a R$ 50. Mais barato. Ele não quis porque era muito
caro.”
Nesta terça (29), o
delegado regional de Santa Maria, Marcelo Arigony, afirmou que a banda
utilizou um sinalizador mais barato, próprio para ambientes abertos.
"Eles compraram um
sinalizador de pirotecnia mais barato, que sabiam que era exclusivamente
para ambientes abertos, porque falaram que era mais barato. O
sinalizador para ambiente aberto custava R$ 2,50 a unidade e, para
ambiente fechado, R$ 70. Eles sabiam disso, usaram este modelo para
economizar. Usaram o equipamento para ambiente aberto porque era mais
barato”, disse o delegado.
Marcelo Santos, que
é vocalista da banda Gurizada Fandangueira, admitiu à polícia que
segurou um sinalizador aceso durante o show na boate Kiss. O músico
negou, no entanto, que as faíscas do artefato tenham provocado o
incêndio e disse que já havia manipulado esse tipo de sinalizador por
diversas vezes em outras apresentações.
Entenda - O
incêndio na boate Kiss, em Santa Maria, região central do Rio Grande do
Sul, deixou 235 mortos na madrugada do último domingo (27). O fogo teve
início durante a apresentação da banda Gurizada Fandangueira, que fez
uso de artefatos pirotécnicos no palco. De acordo com relatos de
sobreviventes e testemunhas, e das informações divulgadas até o momento
por investigadores, é possível afirmar que:
- O vocalista segurou um artefato pirotécnico aceso.
- Era comum a utilização de fogos pelo grupo.
- A banda comprou um sinalizador proibido.
- O extintor de incêndio não funcionou.
- Havia mais público do que a capacidade.
- A boate tinha apenas um acesso para a rua.
- O alvará fornecido pelos Bombeiros estava vencido.
- Mais de 180 corpos foram retirados dos banheiros.
- 90% das vítimas tiveram asfixia mecânica.
- Equipamentos de gravação estavam no conserto.
Prisões -
Quatro pessoas foram presas na segunda por conta do incêndio: o dono da
boate, Elissandro Calegaro Spohr; o sócio, Mauro Hofffmann; o vocalista
da banda Gurizada Fandangueira, Marcelo Santos; e um funcionário do
grupo, Luciano Augusto Bonilha Leão, responsável pela segurança e outros
serviços.
Investigação
- O delegado Marcos Vianna, responsável pelo inquérito do incêndio na
boate Kiss, disse que uma soma de quatro fatores contribuiu para a
tragédia ter acabado com tantos mortos: 1) o fato de a boate ter só uma
saída e a porta ser de tamanho reduzido; 2) o uso de um artefato
sinalizador em um local fechado; 3) o excesso de pessoas no local; e 4) a
espuma usada no revestimento, que pode não ter sido a mais indicada e
ter influenciado na formação de gás tóxico.
O delegado regional
de Santa Maria, Marcelo Arigony, afirmou também na terça que a Polícia
Civil tem "diversos indicativos" de que a boate estava irregular e não
podia estar funcionando. "Se a boate estivesse regular, não teria havido
quase 240 mortes", disse em entrevista. "Mas isso ainda é preliminar e
precisa ser corroborado pelos depoimentos das testemunhas e os laudos
periciais", completou.
Arigony disse ainda
que a banda Gurizada Fandangueira utilizou um sinalizador mais barato,
próprio para ambientes abertos e que não deveria ser usado durante show
em local fechado. "O sinalizador para ambiente aberto custava R$ 2,50 a
unidade e, para ambiente fechado, R$ 70. Eles sabiam disso, usaram este
modelo para economizar. Usaram o equipamento para ambiente aberto porque
era mais barato”, disse o delegado.
O vocalista da
banda Gurizada Fandangueira, Marcelo Santos, admitiu em seu depoimento à
Polícia Civil que segurou um sinalizador aceso durante o show, de
acordo com o promotor criminal Joel Oliveira Dutra. O músico disse, no
entanto, que não acredita que as faíscas do artefato tenham provocado o
incêndio. Ele afirmou que já havia manipulado esse tipo de artefato por
diversas vezes em outras apresentações.
Responsabilidades
- A boate Kiss desrespeitou pelo menos dois artigos de leis estadual e
municipal no que diz respeito ao plano de prevenção contra incêndio.
Tanto a legislação do Rio Grande do Sul quanto a de Santa Maria listam
exigências não cumpridas pela casa noturna, como a instalação de uma
segunda porta, de emergência. A boate situada na Rua dos Andradas tinha
apenas uma, por onde o público entrava e saía. Outra medida que não foi
cumprida na estrutura da boate diz respeito ao tipo de revestimento
utilizado como isolamento acústico.
A Brigada Militar
informou nesta quarta que a boate não estava em desacordo com normas de
prevenção contra incêndios em relação ao número de saídas. Segundo
interpretação da lei, o local atendia as normas ao possuir duas saídas
no salão principal. Mas as portas, no entanto, não davam para a rua, e
sim para um hall. Este sim dava para a rua através de uma só porta. "Foi
um ato possível que o engenheiro conseguiu colocar", disse o tenente
coronel Adriano Krukoski, comandante do Corpo de Bombeiros de Porto
Alegre.
Jader Marques,
advogado de Elissandro Spohr, um dos sócios da boate, disse que a casa
noturna estava em "plenas condições" de receber a festa. Ele falou sobre
documentação da casa, segurança, lotação, e disse que a banda Gurizada
Fandangueira não avisou que usaria sinalizadores naquela noite. O
advogado ainda afirmou que o Ministério Público vistoriou o local
"diversas vezes".
A Prefeitura de
Santa Maria se eximiu de responsabilidade pelo incêndio e entregou
alvará para a polícia que mostra data de validade de inspeção para
prevenção de incêndio, feita pelo Corpo de Bombeiros. A prefeitura
afirma que a sua responsabilidade era apenas sobre o alvará de
localização, que é válido com a vistoria do ano corrente. O documento
informa que a vistoria foi feita em 19 de abril de 2012.
O chefe do Estado
Maior do 4º Comando Regional do Corpo de Bombeiros, major Gerson
Pereira, disse na quarta que a casa noturna tinha todas as exigências
estabelecidas pela lei vigente no Brasil. "Quem falhou, que assuma a sua
responsabilidade. Nós fizemos tudo o que estava ao nosso alcance e não
vou entrar em jogo de empurra-empurra", afirmou.
O Ministério
Público do Rio Grande do Sul abriu um inquérito civil na terça para
investigar a possibilidade de improbidade administrativa por parte de
integrantes da Prefeitura de Santa Maria, do Corpo de Bombeiros e de
outros órgãos públicos por terem permitido que a boate Kiss continuasse
funcionando mesmo com as licenças de operação e sanitária vencidas.
Informações: Jornal Nacional e G1 |