RIO - A juíza de fiscalização da Vara de Execuções Penais do Rio de Janeiro Daniela Barbosa Assunção de Souza determinou a suspensão do serviço do aplicativo de mensagens WhatsApp em todo o Brasil. A magistrada é a mesma que, no ano passado, foi agredida por detentos no batalhão prisional da PM de Benfica. Ela cobra da empresa que as mensagens trocadas por pessoas investigadas sejam desviadas em tempo real antes de ser implementada a criptografia. O bloqueio estava previsto para começar às 14h
As operadoras de telefonia foram notificadas pela Justiça do Rio às 11h30m e precisam suspender imediatamente o uso do serviço. Caso contrário, as empresas ficam sujeitas a uma multa diária de R$ 50 mil. Esta é a terceira vez que o aplicativo, que pertence ao Facebook, é paralisado no país. Procuradas, as operadoras Oi, Nextel, TIM, Vivo e Claro informaram que vão divulgar em breve comunicado sobre o assunto.
A juíza afirma que o Facebook, empresa dona do WhatsApp, foi notificado três vezes sobre a decisão para que fizesse interceptação de mensagens relativas a uma investigação em andamento, em sigilo, em Duque de Caxias, na Baixada Fluminense. Ainda de acordo com a magistrada, a empresa americana teria se limitado a responder, em inglês, que não arquiva e não copia mensagens compartilhadas entre os usuários.
Daniela, no entanto, cobra do WhatsApp que as mensagens trocadas sejam desviadas em tempo real antes de serem criptografadas. "Deve se registrar que o juízo não solicitou em momento algum o envio de mensagens pretéritas nem o armazenamento de dados, medidas estas que os responsáveis alegam não serem passíveis de cumprimento", diz o texto da juíza.
TRATAMENTO DE PAÍS COMO 'REPUBLIQUETA'
Em sua decisão, a juíza critica o uso do inglês nas mensagens da empresa, afirmando que isso demonstra "total desprezo às leis nacionais". Ela lembra que a empresa possui filial no Brasil, está sujeita às leis e à língua nacional, e diz que indica tratamento do país "como uma republiqueta".
O documento aponta ainda que a empresa formulou "perguntas totalmente improcedentes e impertinentes" sobre o caso e ainda pediu que a comunicação fosse feita em inglês. "If possible, please provide responses in English as that will significantly improve our ability to analyze and process your request in a timely manner", apontava a comunicação da empresa, segundo a magistrada.
Em maio, quando o serviço foi bloqueado por determinação da Justiça de Sergipe, o diretor jurídico do WhatsApp, Mark Kahn, veio ao país e afirmou que a empresa não tem como fornecer o conteúdo exigido judicialmente: "Não estou aqui para discutir teses, entendo seu ponto, mas conteúdo ninguém vai ter porque nós não temos”, disse o executivo na época.
A juíza, no entanto, afirma que, se a empresa detém tecnologia para codificar mensagens, precisa também ser capaz de repassar tais conteúdos à Justiça. Além disso, ela destaca que o WhatsApp tem de cumprir as determinações judiciais do país, caso contrário não deve oferecer o serviço no território brasileiro.
"Se as decisões judiciais não podem efetivamente ser cumpridas, e esta informação é sempre rechaçada por peritos da Polícia Federal e da Polícia Civil que afirmam ser possível o cumprimento, como foi possível ao Google do Brasil, em determinada ocasião, cumprir as decisões judiciais que até então alegava ser impossível, deveremos, então, concluir que o serviço não poderá mais ser prestado, sob pena de privilegiar inúmeros indivíduos que se utilizam impunemente do aplicativo WhatsApp para prática de crimes diversos", afirma a magistrada em sua decisão..
Procurada pelo GLOBO, a assessoria de imprensa do WhatsApp informou que ainda não tinha posição oficial sobre o bloqueio do serviço.
BLOQUEIOS ANTERIORES
Esta é a terceira vez que o WhatsApp é bloqueado pela Justiça no Brasil. Em todos os casos, a suspensão foi uma represália judicial por a empresa ter se recusado a cumprir determinação de quebrar o sigilo de dados trocados entre investigados criminais.
O primeiro bloqueio foi em dezembro do ano passado e ocorreu a pedido da 1ª Vara Criminal de São Bernardo do Campo, que determinou a suspensão do serviço por 48 horas. A decisão foi derrubada 12 horas depois, quando o próprio WhatsApp impetrou um mandado de segurança pedindo o restabelecimento do serviço.
Houve ainda uma outra tentativa da Justiça de derrubar o serviço, em fevereiro. Da mesma forma, o objetivo era forçar a empresa a colaborar com investigações sobre casos de pedofilia na internet, desta vez da polícia do Piauí. A decisão, porém, foi suspensa pelos desembargadores Raimundo Nonato da Costa Alencar e José Ribamar Oliveira, do Tribunal de Justiça do Piauí (TJ-PI), que concederam liminares sustando os efeitos da decisão do juiz Luiz de Moura Correia, da Central de Inquéritos do Poder Judiciário em Teresina, que suspendia o uso do aplicativo WhatsApp em todo o Brasil.
A segunda paralisação do aplicativo ocorreu em maio deste ano, por determinação da Justiça de Lagarto, no Sergipe. Na época, a decisão era de que o bate-papo ficasse bloqueado por 72 horas. A medida — proferida em 26 de abril, mas que só chegou às operadoras em 2 de maio — foi ordenada pelo juiz Marcel Montalvão.
Nos dois bloqueios anteriores do serviço, entre os argumentos usados pelos advogados do WhatsApp, estava a questão da proporcionalidade, já que a medida afeta milhões de usuários enquanto os criminosos investigados são apenas alguns.
PRIVACIDADE DE DADOS
A discussão de acesso a dados pessoais de usuários tem ganhado força nos últimos meses. Desde fevereiro, a Apple enfrenta uma batalha judicial contra o FBI, que tenta desbloquear o sistema operacional de um iPhone recuperado de um dos atiradores da chacina em San Bernardino, na Califórnia, no final do ano passado. A empresa se opôs ao objetivo da polícia com os argumento de ameaça à segurança dos usuários.
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