O plenário do Conselho Nacional de Justiça (CNJ)
decidiu nesta segunda-feira (23), por unanimidade, afastar das funções o juiz
da Bahia Vitor Bizerra e abrir procedimento disciplinar para apurar se houve
irregularidade na decisão que autorizou a adoção de cinco crianças na cidade de
Monte Santo, no interior da Bahia.
Ao final da apuração, o CNJ pode decidir pela
aposentadoria compulsória do magistrado, punição mais severa no âmbito do
conselho
O caso foi revelado pelo Fantástico em
outubro do ano passado. Segundo a reportagem, os cinco irmãos foram retirados
pela polícia da casa dos pais biológicos em junho de 2011 e levados para morar
em Campinas e Indaiatuba, no estado de São Paulo, por decisão de Vitor Bizerra
sem que a família ou o Ministério Público fossem ouvidos.
No fim do ano passado, as crianças retornaram para
casa da família biológica por decisão de outro juiz, Luiz Roberto Cappio.
Atualmente, Bizerra atuava na comarca de Barra, também no interior da Bahia.
O advogado Rinaldo Mouzalas de Souza e Silva, que
falou no CNJ em nome de Vitor Bezerra, negou que o magistrado estivesse
envolvido em irregularidades e ofereceu a quebra dos sigilos fiscal, bancário e
telefônico. O advogado argumentou que as crianças eram mal tratadas e rebateu a
reportagem veiculada pelo "Fantástico". "As notícias veiculadas
pela Rede Globo são diferentes da realidade", afirmou - leia mais
argumentos da defesa abaixo.
O corregedor-nacional do CNJ, Francisco Falcão, que
coordena a apuração, propôs abertura de procedimento e o afastamento cautelar
"até decisão final deste feito ou até que o plenário entender conveniente
ou oportuno". O magistrado manterá seu salário, mas ficará impedido de ir
ao local de trabalho e utilizar veículo oficial.
Durante seu voto, Falcão afirmou que, antes da
concessão da guarda para famílias de São Paulo, o juiz não ouviu os pais
biológicos e nem os avós paternos ou maternos.
"Suas vozes acabaram tendo eco somente no ano
seguinte, quando foram ouvidos pelo então magistrado da comarca [Cappio], que
designou audiência de oitiva [depoimento] da genitora das crianças nos
processos, o que ocorreu aos 20/08/2012, quando ela assim relatou a forma como
foram retirados seus filhos", disse Falcão.
O corregedor citou ainda declarações dadas à
imprensa que "comprovariam que as crianças foram retiradas dos pais sem
qualquer cautela, sem que tivessem ciência formal dos motivos, sem oportunidade
de defesa".
"Nos processos analisados, constatam-se, em
tese, falhas graves, demonstradoras, também em tese, de que o magistrado não
cumpriu, nem fez cumprir, com exatidão e serenidade, as disposições legais e os
atos de ofício como são de seu dever", completou o corregedor.
O corregedor destacou ainda que um ofício do
Conselho Tutelar foi enviado para a comarca de Monte Santo no dia 8 de junho de
2011 e que uma semana depois o juiz já tinha autorizado a ida das crianças para
São Paulo.
"O certo é que não consta nos processos que o
magistrado tenha buscado outra solução no seio da própria família, ou mesmo na
comunidade ou região conforme seria de rigor antes de tomar medidas mais
enérgicas", destacou.
Francisco Falcão citou ainda que Bizerra é alvo de
investigação na Bahia por ter supostamente praticado grilagem de terras e de
ter usado de meios ilegais para retirada de invasores de suas terras.
Ao acompanhar o corregedor, o conselheiro Flávio
Sirangelo destacou que a abertura do procedimento disciplinar e o afastamento
seriam necessários porque os fatos narrados afetam a dignidade da pessoa
humana.
"Estamos diante de um caso de elementos
veementes de descumprimento da ordem jurídica processual. De ordem que afeta
pessoas, a dignidade da pessoa humana", afirmou o conselheiro.
Defesa do juiz
Em nome da Associação de Magistrados Brasileiros (AMB), o advogado Emiliano
Alves citou relatos sobre a situação da criança mais nova, então com dois meses
de idade. A mulher que a adotou disse que ela estava com infecção no couro
cabeludo, tumor e com nítidos sinais de maus tratos.
Alves citou que foi a mulher foi prejudicada após
ser apontada por participar de suposto esquema de tráfico de pessoas, enquanto,
na realidade, seguiu todos os trâmites para obter a guarda da criança.
O advogado Rinaldo Mouzalas de Souza e Silva disse,
em sustentação oral no CNJ, que o pai das crianças era "um criminoso
temido na cidade". "Respondia por roubo a mão armada e estupro. [...]
A mãe seria usuária de drogas. [...] Naquela família, nem os país, tios e nem
os avós, tinham qualquer carinho pelas crianças. A razão da celeridade é uma
só, a menor de dois meses corria o risco de morrer", afirmou.A família
sempre negou envolvimento com crimes.
O defensor do juiz explicou ainda que as crianças
foram enviadas para São Paulo somente porque não havia nenhum abrigo por perto.
"[O juiz Vitor Bizerra] nunca se envolveu em tráfico de pessoas." Fonte: G1.com/Ba |