Augusto Gomes da Costa, 66 anos, mora
em uma casa sem energia elétrica na zona rural de São Gonçalo dos Campos, a 108
quilômetros de Salvador. Tem um velho paletó na cor marrom e apego pelo seu
chapéu preto. Ioiô, como é conhecido, desde quarta-feira tem fama de herói no
município, depois que retirou de dentro da agência do Bradesco duas bombas
caseiras que foram usadas numa tentativa de explodir os três caixas eletrônicos
do banco. O homem, que desde a década de 1980 é aposentado por invalidez
em função de problemas mentais, virou sensação na cidade. "Um rapaz foi tirar
um extrato umas 7h da manhã e viu uns pacotes estranhos e saiu correndo. Ioiô
entrou lá, pegou dois pacotes (que estavam sobre os caixas eletrônicos) e
colocou do lado de fora do banco. Ele ficou gritando que estava mole e começou
a apertar sem saber o que era”, conta o motorista Aloísio Emídio, morador da
cidade. Eram as bombas.
A
explosão dos dispositivos foi feita no final da manhã de quarta-feira pelo
Esquadrão Antibomba do Comando de Operações Especiais da Polícia Militar (COE).
"Deu para ouvir o barulho da minha casa, que fica mais de 3 quilômetros
distante daqui. Foi um pipoco de dar susto”, conta o motorista. Ioiô
perambula pela cidade diariamente e ontem, por onde passava, recebia a atenção
da população. "Ô, herói! Vai trabalhar agora no Esquadrão Antibomba é?”,
perguntava o aposentado João da Silva, que diariamente encontra Ioiô no mercado
municipal da cidade. "Agora sou do banco. Pego a bomba e tiro mesmo”, brincava
Ioiô, que passou o dia de ontem dizendo que iria fazer parte da Swat, grupo de
elite da polícia americana.
Na rua, quando era chamado de herói,
começava a cantarolar: "Eu sou de todo mundo e todo mundo me quer bem”, versos
da canção Já Sei Namorar, de Marisa Monte, Arnaldo Antunes e
Carlinhos Brown. Esse último, segundo Ioiô, é seu "maior fã”.
No mercado da cidade, Ioiô compra
cigarros Marlboro – uma carteira por dia – e cachaça com regularidade. "Ele
bebe muito, o que piora o problema de cabeça dele. Acho que por causa disso que
ele fez essa coisa doida de pegar essa bomba. Foi um risco que ele correu muito
grande”, argumenta a irmã dele, Inês Rocha Berão Brandão.
Segundo a polícia, os
explosivos foram colocados na agência por seis homens que pretendiam
explodir o terminal. As bombas seriam acionadas por um cigarro que apagou antes
da detonação. O mototaxista Gilcimar de Lima, que trabalha no ponto em frente à
agência, conta que também pegou nos explosivos. "Se Ioiô pegou eu pensei que
podia pegar também. Fui lá e vi que o cigarro que eles tinham botado para
explodir o banco tinha apagado. Peguei lá na bomba. Ainda bem que não
explodiu”, diz Gilcimar.
Sofrimento
Augusto mora sozinho no povoado Sobradinho, distante 3 quilômetros do banco,
que fica no centro da cidade. Divorciado, ele sofre de problemas mentais desde
1975, segundo relata sua irmã. "Ele vivia com a mulher e a filha pequena em
Periperi, em Salvador. Um dia ele teve um surto e botou fogo na casa. Depois
desse dia não acertou mais o juízo. Ficou internado no Sanatório São Paulo e
depois fugiu pra cá”, relata Inês.
Inês mora na casa em frente à do
irmão, mas diz que não consegue cuidar dele direito. "Ele não quer tomar
remédio nem ir para médico. Fica só tomando pinga e andando aí para as cidades
vizinhas”, diz.
A irmã conta que Ioiô vivia em
Salvador desde a adolescência, quando foi levado para a capital para estudar
por uma vizinha da família. "Fez até o segundo grau e trabalhava no Mosteiro de
São Bento, ajudando os padres. Era como se fosse um sacristão”, relembra a
irmã. Nenhum representante do mosteiro foi encontrado para falar sobre Ioiô.
Ainda segundo a irmã, no mosteiro,
Augusto conheceu a esposa e logo se casaram. "Eles tiveram uma filha, que hoje
é professora, mas tem mais de 20 anos que elas não aparecem aqui para ver ele.
Da última vez, ele estava surtado e elas disseram que nunca mais iam voltar”,
conta Inês. Desse período da vida, Augusto não se lembra. "Salvador? É a
capital do Brasil. Nunca fui lá. Só sei que agora sou herói”. Fonte: Correio |