A casa onde Jean Silva Cerqueira, 35 anos,
morava com os pais, em Parque São Cristóvão, foi incendiada na madrugada de
ontem. Ex-marido de Jéssica Ramos dos Santos, 20 anos, é o principal
suspeito de matar a jovem a facadas na passarela que leva ao Shopping Paralela,
na terça-feira. "Eu não vi quem tocou fogo na casa, acordei com os vizinhos
gritando. Aí foi todo mundo para rua, porque as chamas já estavam altas, não
tinha mais o que fazer”, contou um morador da Rua Oeste, vizinha ao imóvel.O
fogo começou por volta das 3h30, mas a equipe do Corpo de Bombeiros só chegou
às 5h15, quando as chamas já tinham consumido boa parte do imóvel. Às 8h ainda
era possível ver focos de incêndio dentro da casa de três andares. A autoria do
crime é desconhecida. Na hora das chamas, ninguém estava na casa. De acordo com
vizinhos, os pais e o irmão de Jean saíram da casa na noite da terça-feira,
levando sacolas. A mãe de Jéssica, a doméstica Gildete Ramos, que chegou ontem
de Feira de Santana, onde mora, acredita que a família sabe onde está o
suspeito, que continua foragido. "A família dele sabe, sim. Quando a polícia
estava aqui, eu falei que a tia deveria dizer onde ele está, acabei xingando,
mas a dor é minha”. Dela e de muitos parentes e amigos que foram, ontem à
tarde, ao enterro da jovem, no cemitério de Portão, em Lauro de Freitas.
Depois do sepultamento, um grupo de cerca de 100 pessoas fechou a avenida São
Cristóvão por meia hora, queimando pneus e pedindo justiça.
Últimas brigas
Pessoas próximas ao casal e vizinhos contaram que o relacionamento dos dois
sempre foi conturbado. A última briga do casal – que viveu junto durante três
anos, tinha um filho de 2 anos, e terminou há cerca de um ano – aconteceu
no dia anterior ao crime. Segundo vizinhos, começou porque Jéssica viu Jean
brincando com o filho da sua atual namorada. "Ele não dava nada para o filho
deles, aí quando Jéssica viu Jean com o menino no colo partiu para cima dele e
começou a bater, foi uma briga feia na porta da casa dela”, conta a estudante
Fabiane Carvalho, que mora em cima da casa onde morava Jéssica com o filho. Uma
vizinha – sob anonimato – conta que depois da briga, Jean sentou na calçada e
começou a chorar, pedindo que os amigos o ajudassem a retomar o relacionamento.
Mas no dia em que Jéssica foi morta, o comportamento foi bem diferente."Ele
estava completamente transtornado, muito nervoso, muito estranho mesmo. Aí
pegou o carro do pai e saiu correndo daqui”, lembra um vizinho. "Ele chegou a
dizer para a gente que se ela não ficasse com ele, que não ficaria com mais
ninguém”. Um amigo do casal acredita que Jean já vinha premeditando o crime
desde o aniversário da vítima, no último dia 3. "No dia, a gente foi para uma
pizzaria e ele estava lá. Eu vi que tinha uma faca escondida na cintura, e ele
ficou só olhando para ela. Eu nem cheguei a falar nada para Jéssica”. No mês
passado, ele levou um buquê de flores para Jéssica. No dia seguinte, ele cortou
o cabelo da jovem com uma faca e fez vários cortes no rosto da vítima, o que a
levou a fazer uma denúncia na Delegacia de Atendimento à Mulher (Deam). "Ela me
contava das brigas, que ele xingava. Aí quando ele bateu a primeira vez, eu
disse que eles deveriam se afastar, porque quando bate uma vez, não para mais”,
conta a mãe de Jéssica, Gildete.
Medo
Jean chegou a procurar a ex-sogra. "No mês passado, ele me pediu que eu
ajudasse ele a voltar com ela”. Foi aí que Gildete percebeu que o comportamento
de Jean estava estranho e chegou a alertar a filha e o pai dela, Ailton
Oliveira dos Santos, da situação. "Como eu não moro em Salvador e o pai mora
mais perto, eu liguei para ele dizendo: ‘Cuide de nossa filha. Jean não está
normal, está parecendo um louco’”, recorda a mãe, emocionada. Apesar disso, ela
afirma que não sabia muito sobre as brigas e agressões entre Jean e Jéssica.
"Ela não queria me contar nada. Eu sabia as coisas pelas amigas dela que me
ligavam para contar. Acho que ela não queria me deixar preocupada”, diz.Segundo
vizinhos, a separação dos dois causou muitos transtornos para Jéssica, que
tinha medo de perder o emprego na loja do Shopping Paralela, onde trabalhava
como caixa. "Ele a perseguia, ligava o tempo todo para o trabalho, ia lá,
procurava sempre. Ela dizia para a gente que já estava preocupada em ser
mandada embora da loja”, lembra a vizinha Fabiane Carvalho.Segundo colegas de
trabalho, o cerco de Jean era constante. "Depois que ele cortou o cabelo dela,
mandou um buquê de flores na loja, para pedir desculpas. Ela ficou muito
assustada”, contou uma colega de Jéssica, que preferiu não se
identificar. "Ele foi na loja muitas vezes e sempre levava o filho, para
tentar ficar bem com ela”. Nos últimos meses, Jéssica andava mais triste e
tinha medo de ficar sozinha, segundo a colega. "Ela dizia que não queria dormir
só, com medo de ele invadir a casa durante a noite. Às vezes, ela aparecia para
trabalhar com hematomas no corpo e a gente já sabia o que era”.
Manifestação
Depois do enterro, familiares e amigos fecharam a avenida São Cristóvão, por
volta das 16h. De acordo com a Polícia Militar (PM), cerca de 100 pessoas
participaram do ato – elas queimaram pneus e pedaços de madeira, fechando toda
a via, no sentido Centro. O grupo cantou músicas que Jéssica gostava e pediu a
prisão de Jean. "É para chamar atenção das autoridades, porque alguém assim não
pode ficar solto”, disse o pai dela, Ailton Oliveira. Durante o ato, Ailton
desabafou sobre o futuro do neto, de 2 anos. "Estou sozinho para criar ele. Vou
ser pai e avô”.Até a noite de ontem, Jean estava foragido. Procurada pelo
CORREIO, a delegada responsável pelo caso, Jamila Cidade, titular da 2ª
Delegacia de Homicídios, não foi localizada. Segundo a assessoria da Polícia
Civil, as investigações ainda não foram concluídas.
Jean estava proibido de se aproximar da
ex-mulher
A medida protetiva de urgência contra o ex-marido de Jéssica foi expedida
pelo Tribunal de Justiça da Bahia (TJ-BA) no dia 11 de dezembro, um dia após o
pedido feito pela Delegacia Especial de Atendimento à Mulher (Deam). Entre as
restrições, a juíza Mariângela Nardin estabelece que o acusado permaneça a 300
metros de distância da vítima, não frequente os mesmos locais que ela e não
faça contato nem com os familiares de Jéssica, nem com as testemunhas do caso.
Se a determinação fosse desrespeitada, bastaria uma queixa de Jéssica para o
acusado ser preso. A assessoria do TJ garantiu que a documentação foi entregue
aos dois envolvidos. A primeira audiência para discutir o assunto, no entanto,
estava marcada para as 9h15 do dia 8 de maio. Na próxima segunda-feira, Jéssica
e Jean se encontrariam em outra audiência, mas para discutir a pensão alimentícia
do filho do casal, de 2 anos. fonte: correio.
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