As
tatuagens no braço direito da estudante Deisiane Souza Cerqueira, 18
anos, não foram as únicas marcas deixadas no corpo dela pelo tatuador de
35 anos, com quem havia iniciado o namoro há oito meses, em Camaçari,
Região Metropolitana de Salvador (RMS).
Ele
também deixou nela o rosto desfigurado e cicatrizes espalhadas no
pescoço, costas e pernas, fruto de sessões diárias de murros, facadas,
queimaduras de cigarro, mordidas e outras agressões físicas, que
começaram logo após os dois primeiros meses da relação. Deisiane ainda
sofreu tortura psicológica: durante os seis meses em que foi mantida em
cárcere privado, foi ameaçada de morte diariamente.
Os
dois se conheceram há oito meses, numa praça em Abrantes, num encontro
de jovens. Já as agressões começaram há seis meses, quando ele passou a
morar com Deisiane na casa dela. Antes, a estudante vivia com os pais,
mas, há cinco anos, quando eles se separaram, a jovem decidiu ficar com a
mãe, que se mudou pouco tempo depois para o bairro Gravatá. Sozinha, a
estudante decidiu convidar o namorado para morar com ela, no bairro PHOC
II.
O pesadelo durou seis meses até que, na última terça-feira (19),
Deisiane foi resgatada pelo pai, o taxista Robson Cerqueira Santos, 43.
Ele disse ao CORREIO que desconfiava que havia alguma coisa errada com
filha, já que tinha muita dificuldade de conseguir contato com ela.
Segundo Robson, era o namorado da garota quem atendia o celular todas as
vezes que ele ligava, inventando desculpas para que os dois não se
falassem.
"Ele falava que ela estava em Salvador cuidando da avó dele. Era a mesma
história sempre. Os avós maternos dela moravam no andar superior da
casa, mas nada escutavam, porque ela sofria calada. Ele dizia que, se
ela gritasse, a mataria com facadas e mataria também os avós”, contou o
pai.
Desconfiado, Robson foi à casa da filha e encontrou uma luz acesa. Ao se
aproximar e chamar pela primeira vez o nome de Deisiane, a cadela da
família, Nina, começou a latir. "Nina reconheceu minha voz e latiu com
muita força”, contou.
Nesse momento, o namorado não estava no imóvel. "Foi quando escutei o
pedido de socorro de minha filha. Ela gritava meu nome. Então, arrombei a
porta com o pé e encontrei ela naquele jeito deplorável”, declarou.
Robson encontrou a filha bastante machucada. "Ela estava amarrada numa
cama, presa por uma corda. Estava muito fraca, sem comer, cheia de
marcas pelo corpo. Foi terrível ver a minha filha naquele estado.
Carreguei ela nos braços e tirei dali. Depois, fomos à delegacia
registrar o caso”, contou o pai da jovem.
Tortura
O CORREIO conversou com Deisiane que, em poucas palavras, relatou seu
drama. "Se meu pai não me salvasse, tenho certeza que neste momento
estaria morta. Ele com certeza iria me matar”, disse ela, que afirmou
não saber o motivo da mudança de comportamento do namorado.
"Não sei o que houve com ele. Depois de dois meses de namoro, passou a
me trancar dentro de casa, me espancar sem eu fazer nada. Ele deixava eu
comer apenas uma vez por dia”, contou.
Ela conta, ainda, que as torturas que sofreu foram diversas. "Ele
apagava o cigarro na minha nuca, no meu braço, no meu pescoço. Mordia as
minhas costas todas. Já deu uma facada em minha perna. Queimava minhas
pernas e braços com colher quente. Uma vez, atravessou a ponta de uma
faca nos meus lábios. Me esmurrava do nada”, relembrou.
A estudante contou também que o tatuador chegou a colar os ferimentos
dela com uma cola branca comum, utilizada normalmente em papel. "Ele me
batia tanto que as paredes de minha casa estão sujas de meu sangue.
Certa vez, ele bateu tanto, mas tanto, que ele depois começou a usar
cola comum para fechar os ferimentos. Como não conseguia, me esmurrava
no mesmo lugar”, completou a jovem.
Ainda segundo o relato de Deisiane, um dos momentos mais difíceis do cárcere foi quando viu o companheiro beber o sangue dela.
"Não sei porque ele agia assim. Não fazia nada. Ele mudava de humor
repentinamente e começava a me bater. Ele chegou a beber o meu sangue de
uma das porradas que me deu. Ele gostava de figuras satânicas. Acho que
ele surtava”, declarou.
Denúncia
O caso foi registrado na Delegacia Especial de Atendimento à Mulher
(Deam) de Camaçari e está sob os cuidados da delegada Florisbela
Rodrigues. Marcos não foi encontrado pelos policiais da Deam. A pedido
da delegada, o juiz Ricardo José Vieira Santana concedeu medida
protetiva a Deisiane, estabelecendo que o acusado deve ficar a 300
metros a vítima e dos familiares dela.
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