Quando ele chegava para trabalhar como taxista
clandestino no Aeroporto Luis Eduardo Magalhães, já avisava: "Estou
aqui de passagem. Ninguém mexe comigo que eu sou ex-presidiário”. Mas a
passagem de Valdecir Pacheco dos Santos, 39 anos, terminou com a
corrida que fez, no início da madrugada de ontem, do aeroporto até o
Itaigara. Valdecir deixava uma turista carioca no Hotel Fiesta
quando foi abordado ainda dentro do veículo - o Astra branco de placa
JQZ 1457 - e executado com três tiros: dois na cabeça e um nas costas. Segundo
testemunhas, o taxista ofereceu o serviço para uma auxiliar de
marketing de prenome Luna, que tinha acabado de chegar do Rio de
Janeiro e iria se hospedar no hotel, onde participaria de um evento.
Depois de estacionar na entrada do hotel, Valdecir aguardava o
pagamento quando foi alvejado.
HIPÓTESE A polícia diz ainda não ter
pistas do autor do crime, mas a família suspeita que desavenças com
colegas de trabalho tenham motivado o assassinato do taxista, que já
cumpriu pena por envolvimento com tráfico.
"Ele tinha discussões e desavenças com os próprios
colegas no aeroporto. Estamos achando que pode ser intriga de trabalho.
As pessoas estavam ficando com raiva porque ele estava ganhando muito
dinheiro”, afirmou um primo da vítima que já trabalhou no local como
taxista clandestino.
"A gente quebrava os taxistas. Numa corrida
de R$ 80, cobrávamos R$ 60”, reconheceu. Além do primo, um filho da
vítima também começaria a trabalhar como clandestino no aeroporto.
De
acordo com a titular da Delegacia de Homicídios (DH), Francineide
Moura, a passageira depôs ainda na madrugada de ontem e contou que não
conseguiu ver o autor dos disparos. "Ela disse que viu apenas uma mão
encostar na cabeça do taxista e achou que fosse brincadeira”, disse a
delegada. Com os disparos, a turista correu e conseguiu entrar no
hotel. Após a perícia, nada foi encontrado no veículo da vítima.
O
taxista Reginaldo Cohim, que esteve no local do crime, contou que Luna
se confundiu no momento de pegar o táxi. "Ela explicou que o taxista
estava fardado e achou que ele não fosse clandestino. Disse que quando
saiu do aeroporto viu um banner alertando para não pegar clandestino,
mas se enganou”, complementou. "Ela disse também que ele fez a corrida
por R$ 70”, disse.
Na manhã de ontem, ainda muito abalada, a
turista não quis dar entrevista e recebeu só a visita de uma colega da
empresa em que trabalha. "Vim trazer uma mala para ela porque a
bagagem dela ficou toda cheia de sangue. Ela ficou muito abalada”,
contou a colega, que não quis se identificar. A turista retornou ao Rio
ontem mesmo.
família Morador do bairro de Águas Claras e
conhecido como Xuxa, Valdecir já tinha trabalhado como taxista
regularizado e possuía mais um veículo, além do Astra. "Ele tinha um
táxi regular, um Corsa, que emprestou para um amigo trabalhar”, disse
outro primo, Fernando Alves, de 42 anos.
O corpo do taxista foi
enterrado à tarde no Cemitério Bosque da Paz (veja ao lado). No IML,
pela manhã, a mulher do taxista, a auxiliar administrativa Nivaldina
Costa, 37 anos, comentou que o taxista era exemplo para a família. "Ele
era brincalhão, gostava de ajudar todo mundo e costumava trabalhar no
período da noite”, disse Nivaldina. Por conta da morte do marido, ela
contou ainda que um dos dois filhos do casal, de 13 anos, passou mal e
teve que ser medicado. "Meu filho está acabado e disse que vai se
matar. Está tomando calmantes. O pai era tudo para eles”.
Valdecir ameaçava colegas "Ele rodava no
aeroporto. Estava no dia a dia e era uma pessoa aparentemente passiva,
mas tinha antecedentes criminais”, conta um taxista clandestino que
não quis se identificar. Os colegas de Valdecir que trabalham no
aeroporto afirmam que ele vivia fazendo ameaças e tentando "roubar” os
clientes dos outros taxistas. "Ele dizia ‘ninguém mexe comigo que a
minha é outra. Eu sou ex-presidiário’”, conta o mesmo taxista.
Segundo
familiares, o taxista foi preso há dez anos, após conduzir um
traficante, mas que hoje não tinha pendências judiciais. "Atualmente
ele estava limpo, não devia nada à Justiça”, afirmou o primo Fernando
Alves, 42 anos. Ele contou também que o primo tinha boa apresentação e,
por isso, os clientes preferiam andar com ele. "O passageiro preferia
porque ele andava arrumado e era muito educado”, acrescentou. No
entanto, a família confirmou que a vítima tinha discussões frequentes
no aeroporto com outros taxistas.
A morte de Valdecir expõe também o problema da
atuação de taxistas clandestinos na abordagem de turistas dentro do
saguão do aeroporto. "A gente vê a situação no aeroporto e ninguém faz
nada. Os caras ficam no salão de desembarque, ameaçando com armas na
cintura. Eles derrubam a gente porque fazem a preços mais baratos”,
reclamou um taxista regular que, temendo represálias, não quis se
identificar. "Aqui é todo mundo pai de família, mas ninguém tem coragem
de enfrentar”, completou.
Para o diretor financeiro da
Associação de Táxi do Aeroporto Luis Eduardo Magalhães (Atalema), houve
um aumento do número de taxistas clandestinos atuando no aeroporto. "A
situação está pior. Eles (taxistas clandestinos) ficam lá dentro e nos
arredores do saguão, oferecendo a corrida bem mais barata”, alertou. A
associação estima que houve um aumento de 150% no número de taxistas
clandestinos. No entanto, a avaliação foi feita a partir de observações
do dia a dia, sem rigor. Um motorista que não quis se identificar
contou que trabalha no local, transportando turistas associados a
agências de viagem. "A gente traz eles (os turistas) aqui para o
aeroporto. Para não voltar com o carro vazio, a gente oferece uma
corrida”, contou.
Na noite do crime, Valdecir disse que não queria trabalhar Na
noite que antecedeu o crime, antes de sair de casa, por volta das 20h,
Valdecir comentou com a mulher, Nivaldina Costa, de 37 anos, que não
queria trabalhar nessa noite. "Ele não queria ir e disse que estava
cansado porque não tinha dormido direito. Esse foi o último momento que
falei com ele”, lembrou Nivaldina.
Fonte: Correio24horas
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